Por Allef Heberton - Colunista do Studio 33 Em Foco
Em mais um ano atípico, onde os fiéis celebrarão de casa a semana Santa, trago Padre Adilson. Pároco da nossa cidade, homem trabalhador e um humano de coração enorme, que vem trazer sua visão de pandemia, e uma mensagem de conforto para todos que enfrentaram esse vírus. Diante de todas as dores que passamos há mais de um ano, esperamos com fé e confiança que tudo isso passe e que a gente consiga voltar a fazer o que mais amamos.
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Foto: Arquivo pessoal Padre Adilson |
Boa
noite, Padre Adilson. Há quantos anos você é pároco da nossa cidade e como foi
a receptividade das pessoas para com o senhor?
Meus
cumprimentos a você Allef e todos os que estão tendo acesso a essa matéria! Primeiramente
agradeço pelo convite e a oportunidade de poder participar desse tão importante
meio de divulgação da história e cultura de Itinga. Parabéns a todos os responsáveis
pela iniciativa em difundir os acontecimentos históricos e culturais de nossa
tão amada cidade.
Cheguei
em Itinga em 19/03/2017. Dom Marcello Romano, o então bispo da Diocese de
Araçuaí me designou para cá, com a função de administrador paroquial. Em 2018,
foi então que recebi da Diocese a provisão de pároco. Com isso, estou como
pároco desta paróquia há três anos e dois meses. Umas das características
marcantes do povo mineiro é a hospitalidade. Digo com muita tranquilidade que
fui muito bem recebido pela comunidade católica de Itinga.
Itinga tem um povo muito acolhedor. Aproveito
deste momento para agradecer a todos os itinguenses pela hospitalidade,
acolhida e cuidado manifestado para comigo.
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Foto: Arquivo pessoal Padre Adilson |
O
senhor no meio da sua trajetória paroquial, se deparou com uma pandemia que fez
tudo no mundo mudar. Entramos no segundo ano de covid e a igreja precisou se
adaptar as novas normas. Como foi esse processo?
Sou padre há cinco anos e esta é a minha
primeira experiência com pároco. Portanto, não passei por pandemia alguma a não
ser essa de 2020. Ela está nos obrigando a mudar muitos hábitos no nosso estilo
de vida. Exigindo de cada um de nós adaptações às novas maneiras de viver e
conviver. Todos os setores da sociedade foram obrigados a sujeitarem-se as
imposições da pandemia. De modo especial ao isolamento social para frear um
pouco a disseminação do vírus. Com a igreja não foi diferente. Tivemos que
Fechá-la, para evitar a circulação de pessoas e consequentemente do vírus.
Diante disso nossas celebrações ocorreram de forma restrita, somente com a
presença da equipe de celebração.
Confesso que foi uma experiência muito difícil ver a Igreja vazia. Para
não deixar o povo abandonado tivemos que nos valer dos meios de comunicação
sociais para transições de nossos momentos de orações. Porém, não tínhamos e
ainda não temos os aparelhos adequados para realização de tão tarefa. A começar
pela internet que era de poucos megas, o que tínhamos era somente para as
atividades normais da paróquia. Com esforço e dedicação dos garotos: Felipe, Ítalo
começamos nossas transições. Hoje já conseguimos realizar tal tarefa de forma mais
eficaz. Com alguns investimentos e dedicação de Mateus e Paulo a pastoral da
comunicação foi ganhando forma (Pascom). As transições ganharam uma melhor
qualidade. No início, transmitíamos somente por meio de celular. Hoje já se usa
um programa UBS no notebook, O que facilita muito os trabalhos. Ainda temos muito
que investir, falta muitos recursos. Praticamente todos os aparelhos utilizados
para a transmissões são emprestados. Temos muito ainda o que investir. Estamos
pensando em fazer uma promoção, para angariar recursos para aquisição de
aparelhos adequados que facilite os trabalhos.
Falando
em pandemia, iniciamos as celebrações da Semana Santa em nossa cidade em um ano
atípico. O que a igreja está fazendo para suprir a falta de missas e da
celebração da Paixão com a presença das pessoas nessa semana?
Para manter o vínculo da fé, estamos incentivando e orientando as famílias a
transformarem suas casas em pequenas igrejas domésticas. Estávamos perdendo o
costume de rezar em família. A pandemia está nos ajudando a retomar a essa
prática tão fundamental na vida das nossas famílias. A cada celebração do mistério pascal de
Cristo, pedimos às famílias de nossa paróquia que preparem suas casas com os símbolos que
caracterizam aquela celebração específica e que rezem conosco nos
acompanhando através dos meios de
comunicação.
Muita
gente usa Deus para falar sobre a pandemia. Usam frases como
"castigo", falam sobre profecias e até sobre um desfile de escola de
samba para encontrar uma justificativa. O que o senhor acha de tudo isso?
A
pandemia do novo coronavirus não é a primeira a surgir no mundo. Ao analisarmos
a história, percebemos que já existiram outras pandemias na história da
humanidade e que, ceifaram muitas vidas.
Por exemplo, no século 14, houve a peste negra na Europa que matou mais
de 200 milhões de pessoas. Isto não atingiu o mundo todo porque a globalização
estava no seu início. Diante disso, não posso afirmar que a covid 19, seja um
castigo de Deus, até porque, se isso fosse verdade, eliminaríamos de Deus a sua
dimensão misericordiosa para com os seus filhos e filhas. Agora, acredito que
tudo que acontece na história tem um por quê. Particularmente penso que, a
covid 19, vem para nos ensinar a sermos mais humanos. Estávamos nos esquecendo
disso. A covid 19 colocou todos no mesmo patamar, nos mostrou que não tem
ninguém melhor do o outro. Diante desta
pandemia, o “deus dinheiro” não pode salvar como muitos enganosamente pensavam
que poderiam acontecer.
O
senhor como Padre tem a sua proximidade com Deus de forma íntima, e leva todo
conforto para seus fiéis. Qual A sensação de ter que chegar até a essas pessoas
em tempos como esse?
O exercício do ministério presbiteral nestes tempos de pandemia ficou
deficiente. Confesso que me senti impotente. O povo precisando de nossa
presença espiritual, sobretudo na partida dos seus entes queridos e isso era impossível
de realizar, mas essa realidade fez com que a gente rezasse de forma mais
intensa por essas pessoas. Procurei me manter ligado a eles através da oração e
por meios de mensagem de texto via whatsapp e ligações.
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Foto: Arquivo pessoal Padre Adilson |
Olhando
para frente, o que podemos tirar de aprendizado de tudo que estamos passando?
Penso
que esta pandemia nem tudo é espinho, ela tem sua dimensão pedagógica. Ela nos ensina uma lição valiosa sobre a empatia
o cuidado. A empatia foi expandida para além dos nossos ambientes familiares e
amigos. Exigiu de nós o cuidado até
mesmo de quem a gente menos conhecia. E foi assim que no Brasil e no mundo, a
solidariedade se tornou uma das principais
armas contra a pandemia.
Muitas
empresas reorganizaram suas atividades para ajudar na produção
de máscaras e álcool
em gel. A onda solidária chegou até mesmo em gestos simples como fazer as
compras para os vizinhos mais velhinhos, para que eles não precisem se expor ao
risco de contágio.
O Coronavírus nos mostrou que a saúde humana
depende em muito de um meio ambiente saudável.
É notável que, a redução das atividades durante a quarentena fez com que as
águas ficassem mais cristalinas e a qualidade do ar melhorasse. A natureza nos mostrou que do jeito
que estávamos vivemos não dá pra continuar. É hora da humanidade abraçar a
missão urgente de cuidar do nosso planeta e, assim, cuidar de nós mesmos.
Um relatório da ONU apontou
que cerca de 70% das doenças que surgiram desde os anos 1940 tiveram origem
animal, assim como o novo coronavírus. E o motivo disso foi a degradação do
meio ambiente causada pela derrubada desenfreada de florestas, produção
agrícola e comércio de animais
silvestres.
Talvez
a lição mais importante que podemos tirar de tudo isso, é que não podemos mais
tratar a saúde humana, animal e ambiental de maneira isolada. Afinal, fazemos
parte de um todo chamado Terra. O que Leonardo Boff denomina de “aldeia comum”.
Casa comum.
Nesse
momento, mais do que refletir, temos que agir! A pandemia causada pelo
coronavírus já nos ensinou que cada escolha individual faz toda a diferença
para a sociedade e também para o planeta. Ao transformarmos velhos hábitos,
podemos nos tornar cidadãos mais conscientes para cobrar medidas mais firmes de
responsabilidade ambiental, tanto dos governantes, quanto das empresas. Afinal
de contas, o que está em jogo é o próprio futuro da humanidade, não somente um
futuro de alguns.
Como
sociedade, a lição que fica é a de que precisamos de um olhar mais humano e
ouvidos mais atentos. Dessa forma, conseguiremos ouvir as vozes de cientistas,
enfermeiras, catadoras, caixas de supermercado e tantas outras profissionais
que, mesmo com medo, continuaram trabalhando para garantir o bem-estar
coletivo.
Como
será o mundo depois que tudo isso passar? Certamente não seremos mais os mesmos. E isso
pode ser ótimo. Não precisamos voltar àquilo que era considerado “normal”. Até mesmo porque o planeta já nos mostrou que
do jeito que estava não dá mais pra continuar.
Neste
cenário, as mudanças que estamos passando podem trazer inspiração para estilos
de vida mais saudáveis e sustentáveis. Afinal, já estamos vivendo os benefícios
de escolhas mais conscientes durante a quarentena.
Diante
de tudo isso, é urgente que busquemos um novo “normal”. Com alternativas
econômicas mais sustentáveis pautadas na colaboração, solidariedade e respeito
à nossa casa comum, chamada de planeta para o surgimento de outro mundo
possível. Procure conhecer a obra “O Bem
Viver” de Alberto Acosta e a “A economia Donut” de Raworth.
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Foto: Arquivo pessoal Padre Adilson |
Pode
deixar uma mensagem de conforto para as pessoas que perderam seus entes
queridos para essa doença?
Transmito
a essas pessoas que tiveram parentes ceifados pela covid 19 uma mensagem de
esperança de que Deus é o remédio que cura todas as feridas. Não pensem que
isto seja um castigo de Deus. Deus jamais usa de maldade para com os filhos. Se
fizesse isto negaria a si mesmo, pois Ele é amor. Neste deserto que estamos
passando, onde encontramos inúmeros sofrimentos, somos convidados a buscar o
nosso Deus, o seu auxílio a sua ajuda, pois Ele caminha conosco. Tente olhar o
sofrimento por maior que seja com o olhar de Jesus. Um olhar de confiança no Pai. Por isso,
apesar da cruz pesada, não deixem de acreditar em Deus. Foi isso que Jesus fez diante
do maior sofrimento, o de ser morto confiando no Pai.